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Formação de professores para a infância

Categorias de Estudo: formação de professores, identidade profissional, educação infantil, docência, prática social e educativa, cuidar-educar-existir, educação como prática social

O GEPCEI compreende que a Educação Infantil constitui-se como etapa da educação básica essencial para a formação integral dos sujeitos. Ela é, portanto, um direito público e social da criança, o que implica considerá-la em sua condição de política pública, ou seja, como um bem público, como bem comum, portanto, para todas as crianças, independentemente de qualquer condição econômica. Não deve ser concebida como uma política de governo ou política setorial. Deve ser tomada como expressão e resposta da ação permanente do Estado que compreende, articula e promove as ações para atender às necessidades das crianças e suas famílias como sujeitos de direito. Isso requer uma política pública que considere a escuta e a participação ativa desses atores em seus processos de elaboração, implementação e avaliação.  

A educação infantil é uma política pública em que o que está em questão é o direito social da criança em aprender, conviver e ser cuidada. Portanto, o GEPCEI compreende que a educação infantil deve trabalhar na perspectiva de prover o educar-cuidar-existir das crianças. Nesse sentido, compreende-se que  

a infância é uma construção social que se dá num tempo social da vida marcado por singularidades e universalidades no plano natural-social e lógico-histórico; a criança é um sujeito cujas experiências de vida se dão na articulação entre suas especificidades naturais/biológicas de desenvolvimento e suas condições concretas de existência, social, cultural e historicamente determinada. (SIQUEIRA, 2011, p. 186, grifos nossos).

Da mesma forma, o GEPCEI defende a necessidade de se destacar a especificidade e a função do trabalho educativo na educação infantil, diferente daquele produzido no ensino fundamental. Nesse sentido, Rocha (2003) esclarece que,  

enquanto a escola tem como sujeito o aluno, e como objeto fundamental o ensino nas diferentes áreas, através da aula, a creche e a pré-escola têm como objeto as relações educativas travadas num espaço de convívio coletivo e têm como sujeito a criança.’ Na compreensão da autora, a constituição deste espaço de convívio coletivo não abre mão dos processos de aquisição, produção e socialização do conhecimento historicamente acumulado pela sociedade. Ao contrário, defende que creches e pré-escolas reconheçam “as crianças como seres humanos em diferentes contextos sociais”, ao mesmo tempo em que o conhecimento por elas vivenciado no interior destas instituições tenha como foco as “capacidades intelectuais, criativas, estéticas, expressivas e emocionais” das crianças. (p. 5, grifos da autora).

Compreender a função social da educação infantil implica considerar uma perspectiva de educação em seu sentido ampliado. Assim, para o GEPCEI: 

  • A educação é uma prática humana que

passa a ser compreendida no conjunto dos processos, influências, estruturas e ações que intervêm no desenvolvimento humano de indivíduos e grupos na sua relação ativa com o meio natural e social, num determinado contexto de relações entre grupos e classes sociais, visando à formação do ser humano. A educação é, assim, uma prática humana, uma prática social, que modifica os seres humanos nos seus estados físicos, mentais, espirituais, culturais, que dá uma configuração à nossa existência humana individual e grupal. (LIBÂNEO, 2001, p. 7)

  • A educação é uma prática social, um fenômeno social que não se dá

de forma isolada das relações sociais que caracterizam a estrutura econômica e política de uma sociedade, estando subordinadas a interesses sociais, econômicos, políticos e ideológicos de grupos e classes sociais. (LIBÂNEO, 2001, p. 9);

  • A educação é uma política pública que precisa ser tratada no campo do direito. E, de modo particular, do direito público social. Para Dourado e Oliveira (2009), conceber a educação como direito social se contrapõe à ideia de educação como mercadoria, já que

debater tais questões remete à apreensão de um conjunto de determinantes que interferem, nesse processo, no âmbito das relações sociais mais amplas, envolvendo questões macroestruturais, como concentração de renda, desigualdade social, educação como direito, entre outras […] Em outras palavras, é fundamental ressaltar que a educação se articula a diferentes dimensões e espaços da vida social sendo, ela própria, elemento constitutivo e constituinte das relações sociais mais amplas. A educação, portanto, é perpassada pelos limites e possibilidades da dinâmica pedagógica, econômica, social, cultural e política de uma dada sociedade. (DOURADO e OLIVEIRA, 2009, p. 202)

O GEPCEI entende que a formação dos/as profissionais da educação da infância precisa assumir algumas premissas:

  1. Premissas políticas:
    • assumir e atuar na defesa da garantia da Educação da Infância como política pública com qualidade socialmente referenciada que implica a construção de um construto jurídico-político-administrativo, de forma a estabelecer uma política articulada em regime de cooperação, colaboração e assistência técnica-financeira-pedagógica entre os entes federados, a fim de garantir a qualidade dessa etapa da educação. Tudo isso gera a necessidade de um planejamento governamental (regime de colaboração) e intragovernamental (diferentes secretarias) nos municípios; processos de controle social: quem acompanha e quem garante a qualidade do atendimento que está sendo oferecido?
    • assumir a defesa e o posicionamento de que as instituições de educação infantil são espaços em que as crianças, além de brincar e de se socializar, têm o direito de aprender os conhecimentos produzidos historicamente pela humanidade. É isso que faz delas instituições educativas que têm como natureza sua vinculação com a educação básica e o fato de estarem situadas nas redes de ensino. É precisamente o sentido pedagógico e sistematizado que as torna um processo educativo diferente de outras práticas institucionais. Todavia, a apreensão desse conhecimento não se dá numa lógica “escolarizante”, muito menos conteudista; 
    • defesa e luta política pela contratação de recursos humanos para a educação infantil com clara ênfase na docência em nível superior, ainda que do ponto de vista legal essa opção possa contemplar o ensino médio. Um município preocupado com a qualidade da educação na primeira infância não pode prescindir de profissionais qualificados e apostar na valorização do magistério, com planos de carreira condizentes com aquilo que a profissão docente enseja. Nos municípios em que há a ausência de profissionais qualificados em nível superior, há que se criar parcerias com as universidades mais próximas, para que, em regime de colaboração, as demandas possam ser equacionadas;
    • Defesa das Diretrizes Curriculares Nacionais para a Educação Infantil (DCNEI), Resolução nº 5, de 2009 que, em seu art. 6º, reafirmam os princípios que devem orientar qualquer proposta pedagógica ou organização da educação infantil, a saber: 
      • I – Éticos: da autonomia, da responsabilidade, da solidariedade e do respeito ao bem comum, ao meio ambiente e às diferentes culturas, identidades e singularidades;  II – Políticos: dos direitos de cidadania, do exercício da criticidade e do respeito à ordem democrática;  III – Estéticos: da sensibilidade, da criatividade, da ludicidade e da liberdade de expressão nas diferentes manifestações artísticas e culturais. (BRASIL, 2009, art. 6º).
  2. Premissas identitárias:
    • Compreender a educação infantil como etapa da educação básica em que o seu oferecimento se dá em estabelecimentos educacionais e tem como objetivo central os aspectos do cuidar, do educar e do existir. Portanto, reafirmar a criança como centro do processo educativo, portanto, como sujeito político e cognoscente: as propostas pedagógicas da Educação Infantil deverão considerar que a criança, 
      • centro do planejamento curricular, é sujeito histórico e de direitos que, nas interações, relações e práticas cotidianas que vivencia, constrói sua identidade pessoal e coletiva, brinca, imagina, fantasia, deseja, aprende, observa, experimenta, narra, questiona e constrói sentidos sobre a natureza e a sociedade, produzindo cultura. (BRASIL, 2009, art. 4º, grifos nossos). 
    • A formação dos/as profissionais da educação infantil precisa considerar a relação entre profissão, profissionalização e profissionalidade, que se articula a esse debate, cujo critério é o caráter de política pública e a vinculação com a valorização do/a profissional, e que foi sintetizado por Vieira (2009, p. 327-328):
      • […] a atividade exercida no mundo do trabalho e reconhecida institucionalmente. O profissional da educação se ocupa da educação escolarizada e preenche os requisitos de formação e dedicação à tarefa educativa sistematizada. No serviço público, o pré-requisito para o ingresso na profissão é a aprovação em concurso público. A profissionalização resulta de um conjunto de condições indissociáveis: salário, carreira, formação e condições de trabalho. Profissionalização significa superação da ideia de “missão”, de continuidade das atribuições da família, como no conceito de “tia”, contestado por Paulo Freire. Significa, também, o contraponto ao “apoliticismo”, à construção cultural de que o educador tem compromisso com os eventuais mandatários, não com o Estado e a sociedade, e, portanto, não pode contrariar os detentores do poder.
    • Outro conceito que identifica o profissional de educação é o de profissionalidade. Ele expressa, objetiva e/ou subjetivamente, o compromisso com a educação e, também, com o projeto de sociedade Não se limita às condições objetivas de trabalho, mas vincula-se à construção da identidade profissional, na sua dimensão intelectual, ética, política e cultural; 
    • Da mesma forma, o Art. 61. Da LDB define que:
      • consideram-se profissionais da educação escolar básica os que, nela estando em efetivo exercício e tendo sido formados em cursos reconhecidos, são:  I – professores habilitados em nível médio ou superior para a docência na educação infantil e nos ensinos fundamental e médio;  II – trabalhadores em educação portadores de diploma de pedagogia, com habilitação em administração, planejamento, supervisão, inspeção e orientação educacional, bem como com títulos de mestrado ou doutorado nas mesmas áreas; 

        III – trabalhadores em educação, portadores de diploma de curso técnico ou superior em área pedagógica ou afim. (Incluído pela Lei nº 12.014, de 2009) (BRASIL, 2009). 

Assim, o GECPEI defende a perspectiva de que todos/as que trabalham na educação infantil são profissionais da educação e que precisam ser reconhecidos e valorizados do ponto de vista das ocupações de trabalho nessa etapa. Portanto, defende: 

  1. a contratação de profissionais efetivos para o trabalho com a educação infantil. O atendimento não pode se dar pelo trabalho de profissionais em regime temporário; 
  2.  a implementação de políticas públicas municipais de valorização dos profissionais da educação infantil, a fim de assegurar concursos que atendam aos requisitos mínimos de formação em nível superior; 
  3. a construção de agendas formativas e colaborativas que atendam à formação inicial e continuada dos profissionais da educação que atuam como auxiliares da educação infantil.

 

Mas, por que colocar em pauta dos profissionais da Educação para a infância? Porque é preciso reafirmar, antes de tudo, a educação infantil como bem público, que prima pela qualidade social e que tenha como princípio o pressuposto de que todas as crianças podem e devem aprender e se desenvolver em contextos de instituições públicas culturalmente significativas. Uma educação infantil de qualidade não é privilégio de poucos, mas, acima de tudo, direito subjetivo de todas as crianças. Isso implica profissionais formados e valorizados do ponto de vista de suas carreiras. 

 

REFERÊNCIAS:  

BRASIL/Lei nº 9.394, de 20 de dezembro de 1996. Estabelece diretrizes e bases da educação nacional. Diário Oficial da União, Brasília, DF, 23 dez. 1996 

BRASIL/Ministério da Educação. Conselho Nacional de Educação. Câmara de Educação Básica. Resolução CNE/CEB nº 5, de 17 de dezembro de 2009. Fixa as Diretrizes Curriculares Nacionais para a Educação Infantil. Diário Oficial da União, Brasília, DF, 18 dez. 2009 

DOURADO, L. F.; OLIVEIRA, J. F. de. A qualidade da educação: perspectivas e desafios. Cadernos Cedes. Campinas-SP, v. 29, n. 78, p. 201-215, maio/ ago. 2009. 

LIBÂNEO, L. C. Pedagogia e Pedagogos: inquietações e buscas. Educar em Revista. Curitiba: Editora UFPR, n. 17, p. 153-176, 2001. 

ROCHA, Eloisa Acires Candal. A função social das instituições de educação infantil. Revista Zero-a-Seis, Florianópolis, n. 7, jan/jun. 2003. 

SIQUEIRA, Romilson Martins. Do silêncio ao protagonismo: por uma leitura crítica das concepções de criança e de infância. 2011. Tese (Doutorado) – Universidade Federal de Goiás, Goiânia, 2011. 

VIEIRA, Juçara Dutra. Funcionário da educação: o caso do Brasil é singular? Retratos da Escola, Brasília, CNTE, v. 3, n. 5, 2009.  

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